‘Há um grande abismo entre nós’ (Lc 16,26)

Geralmente, Nosso Senhor não nomeia personagens de suas parábolas. O Evangelho deste Domingo é uma exceção. Temos de um lado um pobre esquecido por todos, que morre e vai direto ao Paraíso. Este possui um nome: Lázaro. De outro lado, vemos um rico com vestes caras e boa comida, que ignorava o pobre caído à sua porta. Este, ao contrário, não tem nome e, ao morrer, vai para o inferno. É um anônimo, pois não tinha o nome inscrito nos Céus. 

Lázaro significa “aquele que é auxiliado”. O pobre da parábola foi ajudado somente por Deus. Não encontrou acolhida dos homens. Viveu literalmente as palavras do Salmo: “O nosso auxílio está no nome do Senhor que fez o Céu e a terra” (Sl 123,8). A sua indigência foi um testemunho contra o rico indiferente. Um abismo de indiferença os separava na terra; agora, um abismo intransponível os separa por toda a eternidade. Talvez os pecados mais perigosos para homens “de bem” sejam aqueles de omissão. Omitir-se foi o pecado do sacerdote e do levita que passaram diante do samaritano ferido; e também de Pilatos, que lavou as mãos diante da condenação do Senhor. Quanto mal pode fazer a inação, quando se deve atuar energicamente! 

A negligência do rico nos ajuda a situar melhor o Evangelho do último Domingo, do “administrador infiel”. Este se redimira por meio da diligência, utilizando as “riquezas injustas” com generosidade, perdoando débitos e favorecendo os demais. O rico de hoje não teve a mesma esperteza: encastelou-se e, assim, não teve salvação. Aquele que não se dignava dar uma migalha a Lázaro, agora implora, das chamas eternas, a ponta dos dedos do pobre para lhe aliviar os tormentos. 

No entanto, é tarde! O rico não receberá na morte a compaixão que recusou a Lázaro durante a vida. Como diz o Senhor, “felizes os misericordiosos porque alcançarão misericórdia” (Mt 5,7). As roupas finas com que se revestia disfarçavam um coração miserável. A pena do inferno não é mais do que a manifestação sensível do estado em que sua triste alma já se encontrava neste mundo: morta, estéril, sem amizade com Deus. 

A meditação deste Evangelho pode nos levar a descobrir situações de nossa vida em que talvez estejamos sendo omissos, indiferentes ou sem compaixão. Talvez nos omitamos na ajuda material a pessoas concretas ou em obras de caridade que contam conosco. Talvez omitamos manifestações de afeto devidas àqueles que esperam “migalhas” da nossa atenção e consideração. Talvez omitamos a amizade e o auxílio espiritual a pessoas próximas que não estão bem ou que se encontram talvez à beira do abismo. Pensemos no nosso universo: família, amigos e colegas de profissão. 

Para ver se somos omissos ou não, um critério bastante efetivo é a “Regra de Ouro”: “Tudo o que quereis que os homens vos façam, fazei-o vós a eles. Esta é a Lei e os profetas” (Mt 7,12). Temos a Lei, os Profetas e o Filho de Deus ressuscitado; ouçamo-los! 

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Marcia M B m Pinto
Marcia M B m Pinto
1 ano atrás

Pe. Bechara obrigada pela meditação dessa leitura que por vezes nos é difícil de entender. Louvado seja Nossa Senhor Jesus Cristo. Para sempre seja Louvado!

Suzana C Nascimento
Suzana C Nascimento
1 ano atrás

Sua bênção Padre! Meditação muito preciosa e propícia para esse momento de minha vida. Muito obrigada!